
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Simpático e de fala mansa, Moncho Monsalve, novo técnico da seleção brasileira, não mudou o tom de voz nem nas perguntas mais duras, prova de que o conciliador de que a CBB tanto precisa pode ser ele.
Por telefone, da Espanha, o treinador falou de tática, tempo de contrato, e admitiu que ser bom com palavras não lhe dá nenhuma segurança de que trará os resultados desejados.
>>> "Ainda não assinei contrato com a CBB. Mas confio no senhor Bozikis, e isso não me preocupa. Tenho um compromisso verbal" REBOTE - De quanto tempo é seu contrato com a confederação brasileira e o que representou o convite para dirigir uma equipe com um nível que o senhor jamais comandou?MONCHO MONSALVE - Aos 63 anos, eu já não esperava mais ser chamado para um cargo tão importante. Foi uma surpresa e ao mesmo tempo um sonho se realizando. Nunca treinei uma equipe de ponta. Ainda não assinei contrato com a CBB. Mas confio no senhor Bozikis (Grego), e isso não me preocupa. Tenho um compromisso verbal, e só haverá algo escrito depois da nossa reunião em Madri no começo de fevereiro. Se nos classificarmos para as Olimpíadas, posso continuar como consultor ou treinador.
- É verdade que o senhor tem uma hérnia que o impede de dar treinamentos?- Tive um problema grave de hérnia na coluna, fui operado, estou fazendo tratamento, e o médico me garantiu que, até o fim de março, poderei voltar às atividades físicas normalmente. Quando for ao Brasil, ainda na primeira metade de fevereiro, estarei em ótimo estado de saúde.
- Não é tarde para conhecer a estrutura e os novos jogadores?- Concordo que não é o ideal, mas estou seguindo o campeonato por estatísticas e, em fevereiro, poderei ver dois ou três jogos.
>>> "Há problemas claros no jogo de cinco contra cinco, na defesa e
na condução de bola. É preciso ter mais equilíbrio e cadência" - Como vê a reação de técnicos brasileiros contra seu nome?- Acho isso normal, cada um tenta defender o seu lado. Mas só peço que me julguem pelo meu trabalho, não pela minha nacionalidade. Sou eu que estou chegando, preciso me conectar a eles, e não o contrário. Vou precisar deles, afinal a comissão terá dois assistentes brasileiros. Quero que me ajudem a desempenhar um bom papel. Já converso com o Lula Ferreira e vou querer falar com Hélio Rubens, Guerrinha, Flávio Davis...
- O senhor assistiu aos últimos jogos da seleção brasileira? O que achou?- Há problemas claros no jogo de cinco contra cinco, na defesa e na condução de bola. Não vou mudar o basquete daí, mas sei como ajudá-los. É preciso ter mais equilíbrio e cadência.
- E como melhorar isso? Poderia falar um pouco sobre sua carga tática e a correção dos erros de fundamento?- O primeiro ponto que vou enfatizar é a defesa. Defesa forte impulsiona um jogo de transição de qualidade e um contra-ataque bem feito. É preciso criar um jogo mais eficiente para os pivôs também. Um exercício que gosto é o seguinte: a cada três passes, um será para o interior do garrafão. Isso é básico. Outro fator que quero que os atletas entendam é o do "um passe a mais", que possibilita um arremesso mais seguro e que, inclusive, o Marcelinho Machado conhece. Muitos alegam que ele é um chutador voraz, mas quando jogou comigo ele se adequou ao estilo. Quanto aos fundamentos, este será um grande problema, porque terei pouco tempo, infelizmente. Mas temos como minimizar isso.
>>> "Claro que soube (da crise que envolveu Marquinhos). Mas isso não o exclui da convocação, até porque não o conheço bem. Vou conversar com ele e ver o que aconteceu"
- E sobre os jogadores brasileiros, quem o senhor está observando?- Splitter e Huertas, por exemplo, vejo todos os fins de semana, e eles estão muito bem. Outros que estão na Espanha merecerão uma chance, principalmente o Marcus (foto), o Paulão, o Rafael e o Caio Torres. Tenho visto também o Murilo, de quem gosto muito, Guilherme, Alex e João Paulo Batista. Sobre os da NBA, a mesma coisa - estão sendo observados. Com relação aos da NCAA, não os conheço bem, mas sei que há um na BYU e um em New Mexico [o treinador não lembra os nomes de Jonathan Tavernari e Hatila Passos]. Tenho que buscar informações sobre eles. Além disso, pretendo fazer um
camp com todos que podem formar o time. A primeira semana servirá para eu definir os 12.
- E em relação à posição 3, maior deficiência da seleção? O senhor soube do problema do Marquinhos no Pré-Olímpico?- Claro que soube. Mas isso não o exclui da convocação, porque não o conheço bem. Vou conversar com ele e ver o que aconteceu. Sou partidário da filosofia do Pat Riley: quem quer participar do círculo, que esteja dentro. Quem não quer, que saia e tudo bem. Além disso, não vou permitir que o Marquinhos faça isso comigo, com o time e com a carreira dele, porque não é a melhor decisão. Por aqui me consideram um bom psicólogo porque lido bem com atletas. Considero que temos deficiências nesta posição, sim, mas nada que não possamos corrigir.
- Muita gente gostaria de ver o Brasil jogando com três pivôs. Isso é possível?- Claro que sim! O Varejão e o Murilo (foto) têm capacidade para fazer a posição 3. Hoje, no mundo, times jogam com dois armadores, três alas baixos, três pivôs. Nada é impossível, desde que haja treinamento e construção de espaços.
- E como está sendo seu estudo dos adversários?- Tenho visto fitas com jogos de todos os adversários europeus. Sobre os africanos, tenho bons contatos e espero obter as fitas rapidamente. Mas também quero que nossos adversários se preocupem conosco, e não apenas o contrário. A verdade é que o Brasil tem um excelente grupo de jogadores, e ainda precisa se concretizar como um time. Estou lendo muito também. Coisas de Dean Smith, Chuck Daly, Obradovic e Mike Fratello me serão úteis.
>>> "Sei que a CBB me contratou, mas o correto é que cada país,
como ocorre na Europa, tenha uma liga própria, sem interferência da entidade máxima, que deveria apenas chancelar o campeonato" - O senhor soube do racha entre a confederação e os clubes paulistas, que estão fora do Nacional? O que achou?- Soube, sim. Tive informação, inclusive, de que o Oscar tentou fazer uma liga antes, mas não teve muito sucesso. Se isso acontece, o retrato é claro: a relação entre equipes e confederação não está indo bem. Sei que a CBB me contratou, mas o correto é que cada país, como ocorre na Europa, tenha uma liga própria, sem interferência da entidade máxima, que deveria apenas chancelar o campeonato.
- E a barreira da língua, como vai fazer para superá-la?- Já comprei um livro aqui, para tentar diminuir esse problema. Mas basquete não tem mistério. Tenho que me fazer respeitar, pois sou eu que estou chegando. Se precisar, falo em espanhol, inglês, portunhol, qualquer coisa para que os jogadores tenham carinho e respeito por mim.
- Por fim, aonde esta seleção brasileira pode chegar?- Não tenho dúvida de que conseguiremos a vaga olímpica. Depois saberemos se vamos brigar por medalhas. Prefiro ir passo a passo, até porque sou ótimo com palavras, mas estou aí para ser julgado pelos meus resultados dentro da quadra, não?